Corredores

Ohio, quanto tempo fazia que Isabelle colocava os pés nos Estados Unidos, quando decidiu voltar para esse reencontro não imaginava que a nostalgia viria com tanta força, tantas lembranças desse lugar, lembranças boas e algumas ruins.

Nesse lugar Isabelle tinha aprendido muitas coisas, deixou de ser uma bola de destruição ambulante que destruia tudo em seu caminho, inclusive ela mesma e se tornou uma pessoa focada, objetiva. Alguns hábitos ainda permaneciam, como o leve peso da carteira de cigarro no bolso da sua calça denunciava, mas Isabelle não era mais uma adolescente e sim uma mulher.

Não significava que ela tinha uma vida perfeita, longe disso, enquanto algumas pessoas que tinha convivido na adolescência tinham seguido a fama e se tornado estrelas brilhantes, símbolos de adoração para crianças e adolescentes, Isabelle havia se tornado um buraco negro, vivendo no submundo do crime e seu nome era amaldiçoado por crianças que ficavam órfãs por resultado de suas ordens.

Ela não havia seguido esse caminho por escolha, Isabelle lutou até o final para não seguir o caminho que seu sobrenome lhe forçava, no auge da sua inocência achava que seu nome poderia ser referenciado como uma jovem escritora, ela havia sido tola. Mas esses seus sonhos não duraram muito tempo, em um período curto tudo desabou, seus sonhos com o jornalismo e os seus sonhos com aquela pessoa… Isabelle via atualmente o rosto dela em todos os lugares, até mesmo na Itália, sua voz era ouvida pelos membros mais jovens da família e isso deixava Isabelle louca.

O caminho da máfia Italiana era um caminho sombrio, ela tinha que dar muitas ordens que preferia não dar e a noite quando estava sozinha, era o momento em que seus demônios lhe atormentavam enquanto ela tentava afasta-los com drogas e álcool.

Voltar a Lima, no entanto, não era apenas uma fuga de todos os demônios que a Itália carregava e nem era simplesmente para se divertir com os seus antigos amigos, Isabelle tinha um objetivo ao voltar para o país e era espalhar a Leotta Pharmaceuticals por todo o país, começando por Ohio. A empresa de medicamentos era antiga na Europa e havia começado como uma maneira da família Leotta limpar o dinheiro, mas Isabelle via a empresa como algo a mais, desde que assumiu o comando havia começado a melhorar a empresa, expandir em uma tentativa de torná-la a maior empresa de medicamentos e pesquisa biomedicinal do mundo. Se alguns laboratórios também fossem usados como laboratórios de metanfetamina e outras drogas, bem, isso era consequência.

O primeiro lugar que Isabelle havia ido após deixar as malas na antiga casa da família era William McKinley Highschool, aquela escola por bem ou por mal tinha sido o ambiente de todos os maiores momentos que havia vivido naquela cidade. Os corredores vazios no momento traziam tantas lembranças a Isabelle, uma briga com SanClair pelas cheerios, os beijos que dava na sua ex-namorada, as diversas apresentações que as Troubletones realizaram.


Sem nem menos perceber os seus lábios começaram a cantar baixo a letra da música, a mesma música que havia cantado em sua audição para o coral. Quanto tempo fazia que Isabelle não cantava? Um ano? Dois anos? Nem mesmo ela se lembrava direito.


O tom de sua voz era baixo e apesar de não ter ninguém nos corredores da escola naquele momento ela não queria arriscar ser ouvida. Seus passos eram firmes ao contrário de sua voz que vacilava nas palavras da música. O timbre rouco de sua voz era acompanhado por uma melodia que só existia na sua cabeça, melodia essa que só era escutada por ela e seus piores pensamentos.

Isabelle era Carmen, sempre foi até mesmo naquela época, sua aparência fazia com que os outros se apaixonassem, quisessem estar ao seu lado, mas nenhum ficava muito tempo porque sua mente era como um diamante, dura demais para penetrar.


Isabelle então se viu diante do seu antigo armário enquanto cantava e acariciou o vermelho desbotado, ela ao contrário de Carmen não brilhava mais, ela como esse armário tinha uma alma desbotada, enferrujada, uma alma que perdia seu brilho a cada dia que passava.

Isabelle estava perdida em seus pensamentos quando uma voz suave lhe salvou de sua melancolia, o problema era que essa voz era uma voz que ela não escutava há anos e a dona dessa voz era alguém que era protagonista de seus sonhos muitas noites enquanto a morena estava na Itália.
Respirando fundo para arrumar coragem, Isabelle se virou e encarou os olhos castanhos da garota que havia amado durante um bom tempo. Ela estava diferente, se bem que era óbvio, o tempo mudava a todos, mas não era apenas sua aparência que havia mudado, o ar de confiança em sua postura era algo novo e aquelas palavras…
- Lilian Dennies… Não sei se os deuses lhe ouviram ou a mim, pois devo admitir que lhe reencontrar é como estar no paraíso.
Os cantos dos lábios de Isabelle se ergueram formando um pequeno sorriso ao término de suas palavras. Andou de forma lenta até a frente de Lilian esperando ficar bem próxima a outra garota antes de passar os olhos por cada centímetro de seu corpo dos pés até a cabeça descaradamente, mordiscando de leve o lábio inferior ao terminar.
- Devo dizer que não esperava te encontrar no primeiro dia de volta a esse lugar, não que seja ruim ver uma das poucas pessoas que deixa os Estados Unidos mais bonito.

O riso de Lilian era um dos barulhos favoritos de Isabelle, já havia escutado algumas músicas da garota de relance e achava a voz dela maravilhosa, mas o seu riso, esse som não tinha comparação, aliás até tinha, mas Isabelle preferia não pensar no gemido da garota com ela na sua frente.
Ao perceber o rosto da garota ficando vermelho, o sorriso de Belle aumentou, era bom saber que ainda provocava esses efeitos em Lily. Antigamente a garota era tão tímida e inocente que Isabelle se sentia uma grande vilã por simplesmente ficar perto dela, tinha medo de toda a sujeira em sua alma contaminasse a de Lilian só por estar próxima.
Mas aparentemente o tempo havia mudado a garota diante de seus olhos, na verdade nem sabia se deveria pensar nela como uma garota, era uma mulher agora. Uma mulher muito sensual e com uma auto-confiança surpreendente.
- Dinheiro e sexo, duas coisas extremamente populares e que basicamente comandam este mundo capitalista e lotado de pornografia.
Essa resposta havia sido usada para ganhar tempo, Isabelle estava nervosa, reencontrar e estar na mira daqueles grandes olhos castanhos causava esse efeito e o elogio inesperado que Lilian havia feito lhe deixará levemente envergonhada.
- Obrigada… Eu posso dizer o mesmo, na verdade acho que o tempo conseguiu lhe deixar ainda mais linda, uma coisa que eu não imaginava ser possível.
Os olhos de Isabelle encararam os de Lilian e a medida em que falava eles viajaram até os lábios cheios dela e seu corpo inconscientemente se moveu para mais perto.
- Faz um bom tempo que não nos falamos não é? Você nunca respondeu minha última mensagem.

Realmente Lilian havia mudado, não era comum Lilian se afastar assim de seus avanços, isso era mais um sinal que a mulher diante de seus olhos não era a mesma de alguns anos atrás. Bem, Belle esperava que isso não fosse durar muito tempo, pois só de estar perto dela todos os poros de seu corpo pedia para beijar aqueles lábios.
Suas próximas palavras, no entanto, fez com que os pensamentos do gosto dos seus lábios se afastassem e que a sobrancelha esquerda de Isabelle se arqueasse.
Uma apresentação de Lilian? Bem, Isabelle conhecia algumas pessoas que dariam felizes um dos rins para serem convidadas pessoalmente daquela forma para ouvir a garota cantar.
- Eu entendo, e todo esse trabalho deu certo, afinal você agora é a grande Lilian Dennies, as garotas querem ser como você e os garotos querem ter você.
As palavras saíram dos lábios de Isabelle com um tom mais ácido do que pretendia, era irritante ouvir outras pessoas comentando sobre Lilian, sobre como ela era sexy ou outras besteiras, a italiana tinha perdido a conta de quantas vezes chegou perto de perder a paciência ao ouvir um adolescente bobo desejando a mulher que ela própria desejava.
- No auditório? Pode confirmar minha presença, não perderia a chance de ver uma apresentação sua por nada, só espero não ser expulsa do local quando for a pessoa que gritar mais por você.
Falou em um tom divertido piscando rapidamente com um dos olhos na direção da morena. Isabelle então pegou uma caneta do bolso da calça abriu a tampa com a boca antes de pegar no braço de Lilian e começar a escrever números na mão dela.
- Eu mudei de número por alguns... Pequenos problemas, assim você vai saber como falar comigo.

O sentimento quente que os lábios de Lilian fizeram Isabelle sentir quando encostou em sua bochecha foi confortável e o vazio ao não sentir mais foi triste. Aquela montanha russa de sentimentos que mesmo após anos a cantora lhe proporcionava era emocionante.
Ela definitivamente não era mais uma garotinha tímida que se escondia pelos corredores do colégio com blusas que eram grandes demais para seu pequeno corpo, essa mulher confiante em seus saltos altos sabia do que era capaz e apesar de Isabelle sentir falta da inocência da antiga Lilian, ela também adorava a provocação que essa nova fazia.
Quem diria que Lima continuaria tão interessante
Pensou a garota de olhos azuis enquanto observava a fonte de seu desejo se afastar com os saltos estalando no chão. Após a outra sair, Isabelle pegou a carteira de cigarros no bolso e seguiu em direção a saída, ela precisava de uma bebida.